sexta-feira, 1 de julho de 2011

Nós de silêncio


Laços podem ser vínculos afetivos que nos unem aos outros. No entanto, com a convivência (ou até pela falta dela), os problemas surgem e os laços podem se transformar em nós. "O nó não é entre o homem e a mulher, os problemas existem nos relacionamentos heteros e homossexuais. O nó é entre o 'eu' e o 'outro', sempre", explica o psiquiatra e psicanalista Alfredo Simonetti, autor do livro "O nó e o laço: desafios de um relacionamento amoroso". Em entrevista ao blog, Simonetti diz que a conversa, ou o popular "discutir a relação", é a base para se manter um relacionamento saudável e enfatiza: "É no silêncio que termina uma relação amorosa".

O que são e como se formam os laços em um relacionamento amoroso?
S: Um relacionamento amoroso é baseado em fatos e fantasias reais. De fato escolhemos o nosso parceiro por causa de certas qualidades evidentes (beleza, simpatia, afinidades, etc..), mas também escolhemos o nosso parceiro por características que nem nos damos conta direito. Por que nos apaixonamos por uma determinada pessoa? Pelo que ela é, pela sua essência – responderíamos de pronto, levados pelas ilusões do amor romântico. Mas é bem pouco provável que seja por isto. Em primeiro lugar a paixão é rápida, quando vem é quase instantânea, e para se conhecer a essência de uma pessoa, se é que isto é possível, leva-se muito tempo. Aliás, quando depois de longo tempo de convivência chegamos mesmo a conhecer o outro, muitas vezes nos surpreendemos com o que encontramos e, assustados, reclamamos: "mas você é isso"?...

O que causa a paixão são pequenas coisas, um detalhe do jeito da pessoa nos captura num enlaçamento vertiginoso. Segundo Barthes, "é a voz, a queda dos ombros, a silhueta esbelta, a quentura da mão, o jeito de sorrir, um jeito rápido, mas expressivo de afastar os dedos, de abrir as pernas, de mexer os lábios carnudos ao comer, etc.".

Quem diria que escolhemos a pessoa com quem queremos viver o resto de nossas vidas de maneira tão prosaica? Pois é... E mais, encantamo-nos com um detalhe da pessoa, mas casamos com a pessoa inteira, com todas as suas outras partes de que não gostamos, e às vezes nem conhecemos.

O que são e como se formam os nós entre um casal?
S: Nó é o nome que damos às crises e às dificuldades naturais das uniões amorosas: desencontros, brigas, medo de não sermos amados, ciúmes, tédio, falta de liberdade, questões sexuais, fidelidade, problemas financeiros, divisão do trabalho doméstico, problemas de convivência com as famílias, etc.

Os nós acontecem não por falta de amor, pelo menos não necessariamente. Acontece que mesmo com o amor os nós acontecem, é que é da natureza humana esta dificuldade para se relacionar. Os seres humanos são como porcos-espinhos que, quando sozinhos morrem de frio, que é quando buscam ficar juntinhos. Mas passado algum tempo no calorzinho gostoso, começam a ficar inquietos e acabam espetando-se. Somos todos assim, não conseguimos viver sozinhos, e mal sabemos viver juntos.

"Não tem jeito, ou o homem discute minimamente a relação ou vai discutir muito na relação"

Outra razão para os nós acontecerem é o fato de que quando casamos as neuroses também se casam. Sim, as neuroses se casam, e somos todos, num certo sentido, neuróticos, ou se preferirmos, normóticos. Aliás, o período de namoro é o tempo necessário para descobrir se nossas neuroses combinam. Escolhemos para casar quem nos completa, no bom e no mau sentido. Se a pessoa tem uma tendência a se vitimizar, provavelmente escolherá um parceiro dominador, se a tendência for para ser um grande cuidador ou controlador, certamente escolherá um parceiro carente. Duas pessoas dominadoras têm pouca chance de ficarem juntas por um tempo muito longo, todavia duas pessoas que gostam da disputa, sendo uma mais dominadora e a outra mais passiva, estas sim, têm chance de um casamento longo, longo e repleto de reclamações justas.

Há algum modo de fazer com que o laço perdure por mais tempo?
S: Ao que parece, existem apenas três coisas a se fazer com os nós do casamento, evitar que eles aconteçam, desatar quando já tiverem acontecido, e quando isto não for possível afrouxá-los até poder atravessá-los. Evitar sempre que possível, desatar quase sempre, atravessar sempre, esta é a idéia.

Evitar que os nós aconteçam é a tarefa básica de qualquer casal, tem a ver com aquela história de "regar a plantinha", de cuidar da relação, de ser amoroso e cuidadoso, de aceitar o outro como ele é, de ser criativo para fugir da rotina, e tudo o mais que nos ensina o bom senso. Acontece que todas estas recomendações fazem parte daquelas idéias muito fáceis de serem ditas e extremamente difíceis de serem praticadas. Vejamos um exemplo todos recomendam que a gente seja amoroso, cuidadoso e desprendido. Muito bem, vamos ser, mas o que fazemos com nossa raiva, nossa insegurança, nossa agressividade, e tantos outros "sentimentos ruins" que convivem dentro da gente, lado a lado com os "sentimentos bons"?

E qual seria o caminho para desatar os nós?
S: O amor é claro! Gostaríamos de responder rapidamente, mas, infelizmente, não é assim. O amor não desata nada, sua tendência natural é, ao contrario, reunir, ligar, atrair, e isto tanto no bom como no mal sentido. No casamento o amor põe o time em campo, mas não garante o resultado. Sem ele, é claro, não há jogo, ou o jogo é sem graça. Com ele, o amor conseguiu o direito de jogar a partida, mas o resultado vai depender de muitas outras coisas.

O que pude descobrir ao longo destes anos trabalhando como psiquiatra e psicanalista - com pessoas que se queixam de algum sofrimento amoroso – foi que o conhecimento sobre como funciona o nó do casamento é capaz de aumentar enormemente a habilidade das pessoas para alcançar um casamento feliz. Entretanto cada um fazia isto de um jeito singular, nunca encontrei uma verdade que servisse para todos indistintamente, nenhuma mesmo.


"É preciso ter coragem e abandonar as fantasias do amor romântico, amor incondicional e tudo mais"


Além do conhecimento sobre como se formam os nós também ajuda muito ter coragem para abandonar as ilusões do amor romântico, aquelas histórias de duas metades da laranja, de almas gêmeas, de amor incondicional, de felizes para sempre, de sintonia total, e tudo o mais. Reconhecer as nossas fantasias e nos responsabilizarmos por elas ajuda muito a desatar os nós.

Mas o grande desatador de nós no casamento é, feliz ou infelizmente, a palavra, a conversa amorosa. Mas não é qualquer palavra que serve para a tarefa de desatar os nós. A palavra pode ser monólogo, pregação, aula, debate, bate-boca, solilóquio, reunião, narração, enganação, confissão, argumentação, discurso, comunicado, sedução, xingamento, enunciação, análise, revelação, verso e prosa. Pode ser tudo isto e mesmo assim não ser capaz de desatar os nós.

Ao que parece, é somente a palavra que vai-e-vem entre duas pessoas que se amam, assumindo a forma de uma conversa, que possui aquela magia necessária à arte de desatar os nós.



Recorte do cartaz de O segredo de Brokeback Mountain (2005)


Muitos casais discutem a relação deles com os amigos e se satisfazem somente com o desabafar com os outros, sem falar sobre os problemas com o parceiro. Qual o risco de agir assim?
S: É legal conversar com os amigos, ajuda muito a superar os problemas da relação, mas ficar apenas nisto é que é o perigo. O grande risco é que conversando só com os amigos a pessoa acaba mergulhando ainda mais nas suas fantasias e neuras. Quando escolhemos um amigo para conversar escolhemos aquele amigo que já sabemos que vai nos apoiar, que está do "meu lado". Este é o problema, se não conversamos com o parceiro perdemos a chance de "ver o outro lado". Na verdade são duas conversas necessárias, uma não substitui a outra. É claro que a conversa com o amigo, como expliquei acima, é mais segura. Conversar com o parceiro implica em ouvir coisas que a pessoa talvez queira evitar, mas que são muito importantes.

É mito ou os homens não gostam de discutir a relação? Se sim, por quê?
S: Sim, é fato corriqueiro que os homens não gostam de discutir a relação. O que acontece é que os homens são muito bons em resolver problemas, em buscar soluções, mas fazem isto de uma maneira objetiva e direta, e as mulheres, por seu lado, tem uma tendência maior à subjetividade, à sutileza. Os homens ainda não descobriram que discutir a relação nada tem a ver com resolver problemas. Discutir a relação serve, principalmente, para nos sentirmos escutados, considerados, amados enfim. E não tem jeito, ou o homem discute minimamente a relação ou vai discutir muito na relação.

Como o senhor percebe as diferenças entre o modo de amar do homem e da mulher?
S: A diferença entre homens e mulheres, tão divulgada hoje em dia, é sem dúvida uma das causas dos nós no casamento. Homens e mulheres são iguais em seus direitos, ou pelo menos deveriam ser, mas do ponto de vista psicológico, na forma como encaram a vida, na forma como amam, gozam e sofrem são muito diferentes. Se tivesse que resumir numa frase diria que os homens são simples, objetivos e diretos, as mulheres são complexas, subjetivas e curvilíneas.

"Não é quando o amor acaba que termina uma relação, mas quando acabam as palavras"

Mas é preciso enfatizar que não é a diferença entre a alma feminina e a alma masculina a principal causa dos nós do casamento, porque se fosse assim os casamentos homossexuais seriam harmônicos e pacíficos, e não é o que acontece, neles os mesmos nós do casamento heterossexual também existem. O nó não é entre o homem e a mulher, é entre o "eu" e o "outro".

Por mais saudáveis os laços (os relacionamentos) um dia chegam ao fim. Como saber o momento em que não vale mais a pena tentar desatar os nós?
S: Embora não exista uma resposta simples e direta para esta questão, já que na verdade não se trata do momento em que não vale mais a pena, e sim do momento em que uma pessoa escolhe, decide não mais tentar, é sempre possível apontar alguns indícios do fim de uma relação. Quando é que uma relação termina de verdade? Seguramente não é quando as pessoas se separam fisicamente, ou mesmo judicialmente, porque para muitos é justamente ai, pela ausência, pela falta é que se evidencia a força da ligação afetiva com o outro.

Não é quando o amor acaba que termina uma relação, mas quando acabam as palavras, instalando-se certo estado de indiferença no qual inexistem intenções de palavra em direção ao outro. É no silêncio que termina uma relação amorosa, embora, é claro, nem todo silêncio signifique o fim da relação.

Encerrando Ciclos


Encerrando Ciclos

Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final. Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver. Encerrando ciclos, fechando portas, terminando capítulos - não importa o nome que damos, o que importa é deixar no passado os momentos da vida que já se acabaram.

Foi despedido do trabalho? Terminou uma relação?
Deixou a casa dos pais? Partiu para viver em outro país?
A amizade tão longamente cultivada desapareceu sem explicações?

Você pode passar muito tempo se perguntando por que isso aconteceu. Pode dizer para si mesmo que não dará mais um passo enquanto não entender as razões que levaram certas coisas, que eram tão importantes e sólidas em sua vida, serem subitamente transformadas em pó. Mas tal atitude será um desgaste imenso para todos: seus pais, seu marido ou sua esposa, seus amigos, seus filhos, sua irmã, todos estarão encerrando capítulos, virando a folha, seguindo adiante, e todos sofrerão ao ver que você está parado.

Ninguém pode estar ao mesmo tempo no presente e no passado, nem mesmo quando tentamos entender as coisas que acontecem conosco. O que passou não voltará: não podemos ser eternamente meninos, adolescentes tardios, filhos que se sentem culpados ou rancorosos com os pais, amantes que revivem noite e dia uma ligação com quem já foi embora e não tem a menor intenção de voltar.

As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas realmente possam ir embora. Por isso é tão importante (por mais doloroso que seja!) destruir recordações, mudar de casa, dar muitas coisas para orfanatos, vender ou doar os livros que tem. Tudo neste mundo visível é uma manifestação do mundo invisível, do que está acontecendo em nosso coração - e o desfazer-se de certas lembranças significa também abrir espaço para que outras tomem o seu lugar.

Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se.
Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos. Não espere que devolvam algo, não espere que reconheçam seu esforço, que descubram seu gênio, que entendam seu amor. Pare de ligar sua televisão emocional e assistir sempre ao mesmo programa, que mostra como você sofreu com determinada perda: isso o estará apenas envenenando, e nada mais.

Não há nada mais perigoso que rompimentos amorosos que não são aceitos, promessas de emprego que não têm data marcada para começar, decisões que sempre são adiadas em nome do “momento ideal”. Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará.

Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo, sem aquela pessoa - nada é insubstituível, um hábito não é uma necessidade. Pode parecer óbvio, pode mesmo ser difícil, mas é muito importante. Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida. Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Livro O bem no mal de Alzheimer

O bem no mal de Alzheimer

ALZHEIMER. Difícil de falar, escrever, ler e principalmente, conviver. E como nos comportarmos diante de pessoas do nosso núcleo, portadoras do “mal do século?
A degeneração não atinge apenas o paciente, mas também a estrutura grupal onde está inserido. A qualidade da reorganização de vários aspectos da vida cotidiana diante dessa situação dependerá do conhecimento sobre a doença e seus efeitos.

Com sua experiência em gerontologia, Zulmira Elisa Vono discute,
neste livro, sobre o mal de Alzheimer. Seu texto abrange a complexidade
da doença sob vários pontos de vista: dados estatísticos, informações
sobre a legislação dos direitos do idoso, detalhes do desenvolvimento da doença, problemas de convivência sociofamiliar, entre outros tópicos relevantes sobre os cuidados que devem ser dedicados ao idoso.

O planeta está envelhecendo. Em menos de duas décadas a população de idosos crescerá três vezes mais que a população total. Nem todos serão portadores dessa doença, mas estaremos envolvidos nessa transformação,seja como idoso, seja como familiares de idosos.

Com a ampliação da expectativa de vida, a velhice adquire outro status; é possível viver com qualidade de vida, mesmo na presença do “mal do século”. Como se cria e se cultiva essa qualidade de vida diante da realidade de uma doença que por enquanto não tem cura?
O Senac São Paulo, com a publicação de O bem no mal de Alzheimer, oferece uma leitura que esclarece de forma ampla, profunda e humana essa patologia. Possibilitará às equipes multiprofissionais, aos cuidadores e principalmente aos familiares, acesso a informações preciosas que modificarão o olhar sobre essa patologia, proporcionando maior aceitação, convivencia e qualidade de vida.

Editora: Senac
Ano: 2010
Edição: 1
Número de páginas: 192

Fonte
http://www.zulmiraelisavono.com.br/

O Alzheimer, pelo paciente

03/07/2010 - 16:02h
O Alzheimer, pelo paciente
Médico americano conta o processo de desenvolvimento da doença, dos sintomas ao diagnóstico, e como sua rotina mudou
Arthur Rivin – O Estado de S.Paulo
Sou médico aposentado e professor de medicina. E tenho Alzheimer. Antes do meu diagnóstico, estava familiarizado com a doença, tratando pacientes com Alzheimer durante anos. Mas demorei para suspeitar da minha própria aflição.
Hoje, sabendo que tenho a doença, consegui determinar quando ela começou, há 10 anos, quando estava com 76. Eu presidia um programa mensal de palestras sobre ética médica e conhecia a maior parte dos oradores. Mas, de repente, precisei recorrer ao material que já estava preparado para fazer as apresentações. Comecei então a esquecer nomes, mas nunca as fisionomias. Esses lapsos são comuns em pessoas idosas, de modo que não me preocupei.
Nos anos seguintes, submeti-me a uma cirurgia das coronárias e mais tarde tive dois pequenos derrames cerebrais. Meu neurologista atribuiu os meus problemas a esses derrames, mas minha mente continuou a deteriorar. O golpe final foi há um ano, quando estava recebendo uma menção honrosa no hospital onde trabalhava. Levantei-me para agradecer e não consegui dizer uma palavra sequer.
Minha mulher insistiu para eu consultar um médico. Meu clínico-geral realizou uma série de testes de memória em seu consultório e pediu depois uma tomografia PET, que diagnostica a doença com 95% de precisão. Comecei a ser medicado com Aricept, que tem muitos efeitos colaterais. Eu me ressenti de dois deles: diarreia e perda de apetite. Meu médico insistiu para eu continuar. Os efeitos colaterais desapareceram e comecei a tomar mais um medicamento, Namenda. Esses remédios, em muitos pacientes, não surtem nenhum efeito. Fui um dos raros felizardos.
Em dois meses, senti-me muito melhor e hoje quase voltei ao normal. Demoramos muito tempo para compreender essa doença desde que Alois Alzheimer, médico alemão, estabeleceu os primeiros elos, no início do século 20, entre a demência e a presença de placas e emaranhados de material desconhecido.
Hoje sabemos que esse material é o acúmulo de uma proteína chamada beta-amiloide. A hipótese principal para o mecanismo da doença de Alzheimer é que essa proteína se acumula nas células do cérebro, provocando uma degeneração dos neurônios. Hoje, há alguns produtos farmacêuticos para limpar essa proteína das células.
No entanto, as placas de amiloide podem ser detectadas apenas numa autópsia, de modo que são associadas apenas com pessoas que desenvolveram plenamente a doença. Não sabemos se esses são os primeiros indicadores biológicos da doença.
Mas há muitas coisas que aprendemos. A partir da minha melhora, passei a fazer uma lista de insights que gostaria de compartilhar com outras pessoas que enfrentam problemas de memória: tenha sempre consigo um caderninho de notas e escreva o que deseja lembrar mais tarde.
Quando não conseguir lembrar de um nome, peça para que a pessoa o repita e então escreva. Leia livros. Faça caminhadas. Dedique-se ao desenho e à pintura.
Pratique jardinagem. Faça quebra-cabeças e jogos. Experimente coisas novas. Organize o seu dia. Adote uma dieta saudável, que inclua peixe duas vezes por semana, frutas e legumes e vegetais, ácidos graxos ômega 3.
Não se afaste dos amigos e da sua família. É um conselho que aprendi a duras penas
. Temendo que as pessoas se apiedassem de mim, procurei manter a minha doença em segredo e isso significou me afastar das pessoas que eu amava. Mas agora me sinto gratificado ao ver como as pessoas são tolerantes e como desejam ajudar.
A doença afeta 1 a cada 8 pessoas com mais de 65 anos e quase a metade dos que têm mais de 85. A previsão é de que o número de pessoas com Alzheimer nos EUA dobre até 2030.
Sei que, como qualquer outro ser humano, um dia vou morrer. Assim, certifiquei-me dos documentos que necessitava examinar e assinar enquanto ainda estou capaz e desperto, coisas como deixar recomendações por escrito ou uma ordem para desligar os aparelhos quando não houver chance de recuperação. Procurei assegurar que aqueles que amo saibam dos meus desejos. Quando não souber mais quem sou, não reconhecer mais as pessoas ou estiver incapacitado, sem nenhuma chance de melhora, quero apenas consolo e cuidados paliativos.
ARTHUR RIVIN FOI CLÍNICO-GERAL E É PROFESSOR EMÉRITO DA UNIVERSIDADE DA CALIFÓRNIA

Brasileiro descobre tratamento para mal de Parkinson

Brasileiro descobre tratamento para mal de Parkinson
Postado em 24/03/2009
SÃO PAULO – A revista científica Science publicou na capa, na semana passada, o resultado de uma pesquisa comandada por um brasileiro, nos Estados Unidos. O estudo ganhou destaque porque, com ratos, chegou-se a resultados positivos no tratamento de uma doença que atinge milhões de pessoas no mundo inteiro. O neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis encontrou um caminho alternativo na medicina para tratar o mal de Parkinson.
A doença destrói células nervosas produtoras de dopamina, um neurotransmissor essencial para o controle motor do corpo. O tratamento usado hoje para reduzir os sintomas é uma cirurgia no núcleo do cérebro, considerada de altíssimo risco: um sangramento pode ser fatal.
Com ajuda de cientistas da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, Nicolelis criou uma técnica aplicada em outra área. A equipe usou a medula espinhal para mandar estímulos elétricos até o cérebro. Os estímulos ativaram os neurônios produtores de dopamina.
No método criado pelo brasileiro, um eletrodo foi conectado à medula espinhal de um rato. Com a bateria que envia impulsos desligada, o rato tremia e não conseguia andar. Quando ela foi ligada, com frequência controlada, os estímulos foram enviados e o rato passou a andar normalmente.
Com a camisa da seleção brasileira ao fundo, Miguel Nicolelis contou ao Jornal Nacional como teve a ideia de usar a medula para o tratamento. “É o jeito brasileiro de fazer as coisas, teve um toque de criatividade que nos permitiu criar uma abordagem totalmente diferente, que surpreendeu o mundo inteiro”.
Fonte: http://portalamazonia.globo.com/

Doença de parkinson


DOENÇA DE PARKINSON | Sintomas e tratamento

O mal de Parkinson, também chamada de doença de Parkinson, ou simplesmente Parkinson, é uma doença do sistema nervoso central que afeta a capacidade do cérebro de controlar nossos movimentos. O mal de Parkinson recebe esse nome em homenagem ao Dr. James Parkinson, o primeiro médico a descrever a doença.

Mal de Parkinson : introdução

O nosso cérebro não é responsável apenas pelos nossos pensamentos e raciocínios; todo movimento que fazemos, desde um simples piscar de olhos até o ato de andar, nasce de uma ordem vinda do sistema nervoso central, que através de neurotransmissores chega ao seu destino final, os músculos.

Um grupo de células cerebrais, chamado de neurônios dopaminérgicos, são responsáveis pela produção de dopamina, um neurotransmissor que age no controle dos movimentos finos e coordenados. Alguns atividades do nosso dia-a-dia são tão triviais que nunca paramos para pensar na sua complexidade. O ato de beber um copo d'água, por exemplo, requer um grande controle dos nossos músculos, não só para levar o braço até o copo, mas também para agarrá-lo de modo estável, levá-lo até a boca e virá-lo apenas o suficiente para que uma quantidade x do líquido chegue a nossa boca. Isso são chamados de movimentos finos, muito dependentes da ação dos neurônios dopaminégicos. O mal de Parkinson se caracteriza pela destruição destes neurônios, levando a uma escassez de dopamina no sistema nervoso central e, consequentemente, a um distúrbio dos movimentos.

Fatores de risco para o mal de Parkinson

Os sintomas da doença de Parkinson só surgem quando cerca de 80% dos neurônios encontram-se destruídos. O porquê desta destruição ainda é desconhecido, o que faz com que o mal de Parkinson seja considerada uma doença idiopática, ou seja, sem causa definida. Entretanto, alguns fatores de risco já foram identificados:

- Idade: a doença de Parkinson é um enfermidade tipicamente de pessoas idosas, iniciando-se normalmente ao redor dos 60 anos de idade. É raro encontrar pacientes com mal de Parkinson antes dos 40 anos.
- História familiar: familiares de pacientes com Parkinson têm maior risco de desenvolver a doença
- Sexo Masculino: o mal de Parkinson é mais comum em homens que em mulheres
- Traumas no crânio: isolados ou repetitivos, como nos lutadores de boxe, podem lesar os neurônios dopaminérgicos.
- Contato com agrotóxicos: certas substâncias químicas podem causar lesões neurológicas que levam ao Parkinson.

Sintomas do mal de Parkinson

Os sinais e sintomas do mal de Parkinson podem ser divididos em 2 categorias: motores e não-motores

1.) Sintomas motores do mal de Parkinson

- Tremores: ocorrem principalmente quando o paciente encontra-se em repouso e melhora quando se movimenta o membro. Esta é uma característica que distingue o tremor da doença de Parkinson dos tremores que ocorrem por outras causas.

Em fases inicias da doença, o tremor é intermitente e costuma passar despercebido pelos familiares e amigos. O paciente pode referir uma sensação de "tremor interno", como se algum dos membros estivesse tremendo, quando na verdade, o tremor não é perceptível para outros. Os tremores perceptíveis costumam começar em uma das mãos, normalmente com movimentos entre o dedo indicador e o polegar, como se estivesse a contar dinheiro. Com o passar dos anos a doença avança e os tremores se tornam mais generalizados, alcançando outros membros.

O tremor em repouso é o sintoma inicial do mal de Parkinson em 70% dos casos. Com o evoluir da doença, praticamente todos os pacientes apresentarão algum grau de tremor. São poucos os casos de Parkinson que não causam tremores.

Como o tremor da doença de Parkinson ocorre em repouso e melhora à movimentação, este acaba não sendo um sintoma muito incapacitante, ao contrário da bradicinesia.

- Bradicinesia: significa movimentos lentificados. A bradicinesia é o sintoma mais incapacitante do Parkinson. O paciente sente-se cansado, com intensa fraqueza muscular e sensação de incoordenação motora. Tarefas simples tornam-se muito difíceis, como abotoar uma camisa, digitar no computador, pegar moedas dentro do bolso ou amarrar os sapatos. O doente refere dificuldade para iniciar qualquer movimento voluntário. O paciente torna-se hesitante e descoordenado.

Com o tempo até andar vira uma tarefa difícil; os passos tornam-se curtos e lentos, o paciente apresenta dificuldade para se levantar e sente-se desequilibrado quando em pé.

- Rigidez: a rigidez dos músculos é outro sintoma importante do mal de Parkinson. Assim como o tremor e a bradicinesia, a rigidez inicia-se apenas de um lado, generalizando-se conforme a doença progride. A sensação que se tem é a de que os músculos estão presos, muitas vezes limitando a amplitude dos movimentos e causando dor. Um dos sinais típicos é a perda do balançar dos braços enquanto se anda.

- Instabilidade postural: nosso equilíbrio enquanto andamos ou permanecemos em pé depende do bom funcionamento do cérebro; é ele que controla nosso tônus e reflexos musculares que mantêm nosso centro de gravidade estável. A perda da estabilidade postural é um sintoma que só ocorre em fases avançadas da doença de Parkinson, manifestando-se principalmente com quedas regulares.

Outros sintomas comuns do mal de Parkinson:
- Perda expressão facial (expressão apática)
- Redução do piscar dos olhos
- Alterações no discurso
- Aumento da salivação
- Visão borrada
- Micrografia (caligrafia altera-se e as letras tornam-se pequenas)
- Incontinência
2.) Sintomas não-motores do mal de Parkinson

Além de todas as alterações motoras, os pacientes com doença de Parkinson também podem desenvolver uma data de alterações neurológicas como demência, alterações do sono, depressão, ansiedade, memória fraca, alucinações, psicose), perda do olfato, constipação intestinal, dificuldades para urinar, impotência sexual, raciocínio lentificado e apatia.

Diagnóstico do mal de Parkinson

Várias outras doenças neurológicas podem apresentar um quadro clínico semelhante ao mal de Parkinson, o que torna difícil a distinção, principalmente me fases inicias da doença.

O grande problema é que não existe um exame complementar, seja de sangue ou de imagem, que forneça o diagnóstico da doença de Parkinson. O médico baseia-se apenas na história clínica e no exame físico para fechar o diagnóstico, o que torna importante a experiência do especialista.

Em geral, para o diagnóstico é preciso identificar 2 dos 3 principais sintomas motores (tremor em repouso, bradicinesia ou rigidez), associado a uma melhora destes com o uso de medicamentos específicos para doença de Parkinson. Nem sempre o quadro clínico inicial é suficientemente claro para se estabelecer o diagnóstico.

Tratamento do mal de Parkinson

Não há cura para o mal de Parkinson, porém, os tratamentos atuais são bastante efetivos no controle dos sintomas.

Uma das drogas mais usadas é a levodopa + carbidopa (Sinemet), que é transformada em dopamina dentro do cérebro. Várias outras drogas que simulam a ação da dopamina no cérebro podem ser usadas, entre elas: bromocriptina, pramipexol e ropinirol.

Alem do tratamento medicamentoso, a prática de exercícios regulares é importante para retardar os sintomas motores da doença.


Leia mais: http://www.mdsaude.com/2010/08/mal-parkinson.html#ixzz1LbMdD8vO

Tratamento farmacológico da doença de Alzheimer

Tratamento farmacológico da doença de Alzheimer
Orestes V. Forlenza1


1 Médico Psiquiatra. Doutor em Medicina pelo Departamento de Psiquiatria da Universidade de São Paulo. Médico Pesquisador e Coordenador do Ambulatório de Transtornos da Memória do LIM-27, Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Endereço para correspondência:
Orestes V. Forlenza. Laboratório de Neurociências – LIM 27, Departamento e Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Av. Dr. Ovídio Pires de Campos 785 – 05403-010 – São Paulo – SP; e-mail: forlenza@usp.br



Resumo


O presente artigo de revisão aborda as perspectivas atuais e futuras no tratamento farmacológico da doença de Alzheimer. Os benefícios e limitações da terapia de reposição colinérgica, representada fundamentalmente pelos inibidores das colinesterases, são apresentados com base em dados de pesquisas neurobiológicas, farmacológicas e clínicas, ilustrados pelos principais estudos controlados por placebo e por estudos recentes de metanálise. O papel da memantina nos casos de demência moderada a grave, bem como as perspectivas de seu emprego em associação com os inibidores das colinesterases, são discutidos adicionalmente com base em achados clínicos e neurobiológicos. Discute-se o papel da reposição estrogênica, dos antioxidantes, das estatinas e dos antiinflamatórios no tratamento e na prevenção da demência, levando em consideração os resultados negativos oriundos de estudos clínicoepidemiológicos recentes. Finalmente, são apresentadas algumas perspectivas futuras do tratamento da doença de Alzheimer: entre as estratégias farmacológicas, que têm como objetivo modificar mecanismos patogênicos, são abordadas as diferentes modalidades da terapêutica antiamilóide, com destaque na imunoterapia da doença de Alzheimer.

Palavras-chave: Doença de Alzheimer, demência, amilóide, farmacologia, tratamento.

Introdução



A doença de Alzheimer (DA) é a principal causa de declínio cognitivo em adultos, sobretudo idosos, representando mais da metade dos casos de demência. A idade é o principal fator de risco: sua prevalência passa de 0,7% aos 60 a 64 anos de idade para cerca de 40% nos grupos etários de 90 a 95 anos. Isso revela a magnitude do problema no Brasil, onde já vivem cerca de 15 milhões de indivíduos com mais de 60 anos.

A DA caracteriza-se por distúrbio progressivo da memória e outras funções cognitivas, afetando o funcionamento ocupacional e social. O transtorno da memória afeta os processos de aprendizado e evocação. Ocorre diminuição na aquisição de novas informações, com piora progressiva até que não haja mais nenhum aprendizado novo. Embora haja certa preservação da memória remota, em estágios iniciais, a perda de memória é global na evolução da DA. O indivíduo tornase progressivamente incapaz de desempenhar atividades da vida diária (trabalho, lazer, vida social) e de cuidar de si mesmo (cuidar do próprio asseio pessoal, vestir-se, alimentar-se), passando a depender de um cuidador. Na doença avançada, observa-se a tríade afasia, apraxia e agnosia, caracterizada pela perda significativa da linguagem, da capacidade de desempenhar tarefas e de nomear pessoas e objetos. Alterações psíquicas e comportamentais, tais como psicose, alterações do humor e do sono, agitação psicomotora e agressividade, estão presentes em até 75% dos casos, em algum estágio da evolução da demência, causando grande desgaste para os cuidadores, e necessitando de intervenções farmacológicas pontuais.

Bases neurobiológicas da terapêutica da doença de Alzheimer


Ao longo do curso evolutivo, diferentes mecanismos de neurodegeneração preponderam nas distintas regiões cerebrais acometidas, de acordo com a idade do paciente e dos fatores de risco presentes. As vias neurais pertencentes ao sistema colinérgico e suas conexões são preferencialmente atingidas na DA. As alterações cerebrais características da DA são as placas senis (ou neuríticas) e os emaranhados neurofibrilares. As placas senis resultam do metabolismo anormal da proteína precursora do amilóide (APP), conduzindo à formação de agregados do peptídeo β-amilóide; os emaranhados neurofibrilares formam-se a partir do colapso do citoesqueleto neuronal, decorrente da hiperfosforilação da proteína tau. Estas alterações ocorrem, desde o início da doença, em estruturas do lobo temporal medial, incluindo o hipocampo e o giro para-hipocampal, consideradas estruturas essenciais para os processos de memória. Com a evolução da doença, o processo degenerativo se espalha para o neocórtex de associação, atingindo áreas cerebrais responsáveis por outros processos cognitivos.

Admite-se que anos antes do início da demência já ocorra deposição de peptídeos β-amilóide e seu respectivo acúmulo nas porções mediais dos lobos temporais, comprometendo a neurotransmissão colinérgica. À medida que esse processo evolui, somam-se as reações gliais inflamatórias e oxidativas, além do comprometimento do citoesqueleto, levando à formação dos emaranhados neurofibrilares e à conversão das placas senis em neuríticas. Portanto, paralelamente à progressão do processo patogênico, ocorre conversão do comprometimento cognitivo leve para os estágios iniciais da demência. Na demência moderada e avançada, intensificam-se as perdas neuronais e surgem disfunções sinápticas e neuroquímicas, afetando, sobretudo, os sistemas colinérgico, serotonérgico e glutamatérgico. Essa heterogeneidade biológica correlaciona-se com o tipo e a intensidade das manifestações psíquicas e cognitivas.

Portanto, a DA cursa com redução da função colinérgica central, principalmente em áreas límbicas e temporoparietais. Observa-se degeneração das projeções colinérgicas oriundas do prosencéfalo basal em direção à formação hipocampal, bem como redução da atividade da enzima colina-acetiltransferase, responsável pela síntese de acetilcolina. Tal disfunção acomete predominantemente o nível pré-sináptico, com relativa preservação da neurotransmissão pós-sináptica (partindo do hipocampo em direção às demais estruturas temporais, límbicas e neocorticais). Esse é o racional da terapêutica com drogas que aumentam a disponibilidade sináptica de acetilcolina.

Tratamento farmacológico da doença de Alzheimer


O tratamento farmacológico da DA pode ser definido em quatro níveis: (1) terapêutica específica, que tem como objetivo reverter processos patofisiológicos que conduzem à morte neuronal e à demência; (2) abordagem profilática, que visa a retardar o início da demência ou prevenir declínio cognitivo adicional, uma vez deflagrado processo; (3) tratamento sintomático, que visa restaurar, ainda que parcial ou provisoriamente, as capacidades cognitivas, as habilidades funcionais e o comportamento dos pacientes portadores de demência; e (4) terapêutica complementar, que busca o tratamento das manifestações não-cognitivas da demência, tais como depressão, psicose, agitação psicomotora, agressividade e distúrbio do sono.

O tratamento da DA envolve estratégias farmacológicas e intervenções psicossociais para o paciente e seus familiares. Estas últimas não serão abordadas neste capítulo. No campo do tratamento farmacológico, inúmeras substâncias psicoativas têm sido propostas para preservar ou restabelecer a cognição, o comportamento e as habilidades funcionais do paciente com demência. Contudo, os efeitos das drogas hoje aprovadas para o tratamento da DA limitam-se ao retardo na evolução natural da doença, permitindo apenas uma melhora temporária do estado funcional do paciente.

Inibidores das colinesterases

Os inibidores das colinesterases (I-ChE) são as principais drogas hoje licenciadas para o tratamento específico da DA. Seu uso baseia-se no pressuposto déficit colinérgico que ocorre na doença, e visa o aumento da disponibilidade sináptica de acetilcolina, através da inibição das suas principais enzimas catalíticas, a acetil e a butirilcolinesterase. Têm efeito sintomático discreto sobre a cognição, algumas vezes beneficiando também certas alterações não-cognitivas da demência.

Os I-ChE podem ser classificados com base na reversibilidade e duração da inibição das colinesterases (Tabela 1). Tacrina, galantamina e donepezil são inibidores reversíveis da acetilcolinesterase, respectivamente de duração curta, intermediária e longa. A inibição da enzima tem duração intermediária para o inibidor pseudo-irreversível (ou lentamente reversível) rivastigmina, e longa para o inibidor irreversível metrifonato. Este último teve os seus estudos clínicos descontinuados, devido à sua toxicidade. Tacrina e rivastigmina inibem também a butirilcolinesterase, o que pode resultar em maior incidência de efeitos colaterais periféricos; por outro lado, a butirilcolinesterase também está envolvida na maturação das placas neuríticas, e sua inibição pode representar benefícios adicionais ao tratamento (Mesulam e Geula, 1994). A inibição das colinesterases pela rivastigmina é classificada como pseudo-irreversível, uma vez que ocorre dissociação temporal entre seus parâmetros farmacocinéticos e farmacodinâmicos: a interação da enzima com a rivastigmina, na fenda sináptica, leva à formação de um produto de clivagem fenólico com atividade farmacológica mínima e rápida excreção, e de um complexo carbamilado com a enzima, que impede a hidrólise da acetilcolina, por inibição competitiva e duradoura, porém reversível. Com isso, os efeitos inibidores perduram após a eliminação da droga–mãe e seus metabólitos, reduzindo assim os riscos de interações medicamentosas.

A resposta aos I-ChE é heterogênea, sendo que alguns pacientes beneficiam-se muito, enquanto outros, muito pouco. Estudos controlados por placebo mostram que os benefícios são geralmente observados a partir de 12 a 18 semanas e, possivelmente, desaparecem após seis a oito semanas da interrupção do tratamento (Jann, 1998). Os estudos que avaliaram a eficácia dos I-ChE mostraram, de forma consistente, que a sua administração para pacientes com DA leve ou moderada resulta em benefícios discretos, mas significativos em relação aos grupos não-tratados, sobre a cognição, o comportamento e as capacidades funcionais. Dois estudos de metanálise recentemente publicados atestam os benefícios sintomáticos dos IChE (Lanctôt et al., 2003; Rockwood, 2004).


Dada a ausência de preditores clínicos ou biológicos de eficácia, justifica-se a prescrição de um inibidor da colinesterase para todos os pacientes com diagnóstico de DA leve ou moderada, desde que não haja contra-indicações para o seu uso. Evidentemente, o manejo racional dessas medicações envolve também a decisão do momento de interrompê-las. As drogas antidemência devem ser descontinuadas nos seguintes casos: (1) quando o paciente adere mal ao tratamento; (2) se a deterioração cognitiva mantém-se no mesmo ritmo prévio, após três a seis meses de tratamento; (3) quando há rápida deterioração após um período inicial de estabilização; ou (4) se, após um período de interrupção do tratamento, constata-se que a droga não está mais proporcionando benefícios (Lovestone et al., 1997). Em todos esses casos, deve-se pesar a relação custo-benefício do tratamento, uma vez que os I-ChE são medicamentos de alto custo. Os resultados de um grande estudo multicêntrico realizado nos Estados Unidos questionam essa relação, uma vez que os pacientes tratados com donepezil, embora apresentassem indícios de melhora cognitiva discreta, não foram beneficiados pelo tratamento no que diz respeito à progressão para incapacitação funcional e institucionalização (Courtney et al., 2004).

Os estudos iniciais com a tacrina documentaram sua eficácia em pacientes com DA e lançaram os alicerces da terapia de reposição colinérgica na DA. Contudo, o uso da tacrina está associado ao elevado risco de hepatotoxicidade, observada em 30% a 50% dos casos. A necessidade de monitorização da função hepática, ao lado de uma maior dificuldade posológica (quatro tomadas diárias), fizeram com que a tacrina caísse em desuso.

Os inibidores das colinesterases de segunda geração (donepezil, rivastigmina, galantamina) apresentam propriedades farmacológicas semelhantes, muito embora algumas características farmacocinéticas e farmacodinâmicas os diferenciem entre si. Os efeitos dos inibidores das colinesterases ocorrem em uma janela terapêutica de 30% a 60% de inibição da enzima, promovendo aumento da disponibilidade sináptica de acetilcolina. Tais percentuais são geralmente atingidos nas doses terapêuticas usuais (Tabela 2), com eventual piora em níveis mais altos de inibição. Os perfis de efeitos colaterais dessas drogas são também semelhantes, apresentando em geral boa tolerabilidade. Podem acarretar efeitos colaterais importantes, resultantes da hiperativação colinérgica periférica, tais como: (1) efeitos adversos gastrintestinais: náuseas, vômitos, diarréia, anorexia, dispepsia, dor abdominal, aumento da secreção ácida; (2) cardiovasculares: oscilação da pressão arterial, síncope, arritmia, bradicardia; (3) outros sintomas como tonturas, cefaléia, agitação, insônia, câimbras, sudorese, aumento da secreção brônquica.


Memantina

A justificativa para o uso da memantina na DA reside nos seus efeitos sobre a neurotransmissão glutamatérgica que, assim como a colinérgica, encontra-se alterada nessa doença. O glutamato é o principal neurotransmissor excitatório cerebral, particularmente em regiões associadas às funções cognitivas e à memória, tais como o córtex temporal e o hipocampo. O glutamato também age como uma excitotoxina, causando a morte neuronal quando níveis elevados desse neurotransmissor são liberados por períodos prolongados. As regiões corticais e subcorticais que contêm neurônios e receptores glutamatérgico sofrem perdas estruturais e funcionais na evolução da DA (Li et al., 1997; Rogawski e Wenk, 2003). A memantina é um antagonista não-competitivo de receptores NMDA, permitindo sua ativação fisiológica durante os processos de formação da memória, porém bloqueando a abertura dos canais e sua ativação patológica (Parsons et al., 1993). Essa propriedade deve-se aos efeitos rápidos, voltagem–dependentes, das interações da memantina com os receptores NMDA. Em condições fisiológicas, a memantina exerce ação semelhante aos íons magnésio.

A memantina bloqueia os receptores NMDA no estado de repouso e, assim como o magnésio, é deslocado de seu sítio de ligação em condições de ativação fisiológica; em contrapartida, não se desprende do receptor na vigência de ativação patológica. Essas propriedades conferem à memantina uma ação neuroprotetora contra a ativação excitotóxica de receptores de glutamato (Misztal et al., 1996).

A segurança clínica do uso da memantina foi demonstrada por meio de estudos clínicos controlados por placebo com mais de 500 pacientes portadores de demência leve ou moderada (Pantev et al., 1993). Doses diárias entre 20 e 30 mg proporcionaram benefícios sobre as funções cognitivas, motoras e comportamentais. Nos estudos de fase 2, com durações de quatro a seis semanas, concluiu-se que a incidência de reações adversas com a memantina não foi significativamente superior ao placebo. Os efeitos colaterais mais comumente relatados em pacientes recebendo memantina foram diarréia, vertigens, cefaléia, insônia, inquietação, excitação e cansaço (Jarvis e Figgitt, 2003).

A absorção da memantina no trato gastrintestinal leva ao pico de disponibilidade sérica entre três e oito horas. São necessárias duas tomadas (10 mg) para completar a dose diária usual de 20 mg. A eliminação é fundamentalmente renal, não interferindo com enzimas do citocromo P450. Portanto, não são esperadas interações farmacocinéticas nesse nível. A co-administração da memantina e I-ChE é possível, com baixíssimos riscos de interações medicamentosas (Jarvis e Figgitt, 2003).

Winblad e Portis (1999) avaliaram a eficácia clínica e a tolerabilidade da memantina em 166 pacientes internados portadores de demência primária moderada e grave, incluindo os diagnósticos de DA e demência vascular. Utilizando-se de medidas funcionais, ao invés de cognitivas, os autores concluíram que o tratamento com memantina (10 mg ao dia, por 12 semanas) proporcionou, independentemente da etiologia da demência, benefícios funcionais e comportamentais, reduzindo a dependência de cuidados assistenciais. Mais recentemente, Reisberg et al. (2003) comprovaram a eficácia clínica da memantina no tratamento de pacientes portadores de DA moderada a grave. Nesse estudo multicêntrico norte-americano, de desenho duplo-cego e controlado por placebo, 181 de 252 pacientes recrutados em 32 centros concluíram 28 semanas de tratamento com memantina (20 mg ao dia) ou placebo. Os pacientes que receberam memantina não apresentaram efeitos adversos significativamente superiores aos do grupo placebo, e a taxa de descontinuação de tratamento foi maior nos pacientes do grupo placebo (42 contra 29 no grupo memantina). Os pacientes que receberam memantina apresentaram evolução mais favorável do que os pacientes do grupo placebo de acordo com os escores das escalas de avaliação clínica e funcional, permitindo aos autores concluir que a terapêutica antiglutamatérgica é capaz de reduzir a deterioração cognitiva e funcional em pacientes portadores de demência moderada a grave (Reisberg et al., 2003). Em pacientes com DA moderada a grave recebendo doses estáveis de I-ChE, o tratamento combinado com memantina, além de seguro e bem tolerado (Wenk et al., 2000), pode favorecer desfechos mais favoráveis em parâmetros cognitivos, funcionais e comportamentais, sustentando a indicação do tratamento combinado (Tariot et al., 2004).

Outras abordagens terapêuticas


Antioxidantes

Inúmeros estudos apresentaram evidências de que o estresse oxidativo, através da formação de radicais livres de oxigênio, pode contribuir para a patogenia da DA, o que justificaria o emprego de substâncias antioxidantes. Desse modo, a vitamina E (α-tocoferol) em doses altas (1.000 UI duas vezes ao dia) e a selegilina (10 mg ao dia) têm sido empregadas como adjuvantes do tratamento da DA. Embora não
proporcionem melhora objetiva da cognição, podem retardar a evolução natural da doença, exercendo um suposto efeito neuroprotetor. Apenas um estudo realizado com metodologia adequada demonstrou
benefício do uso da vitamina E na DA (Sano et al., 1997). Nesse mesmo estudo, os autores demonstraram algum benefício do uso da selegilina, embora mais modesto do que o observado para a vitamina E. Contudo, a revisão sistemática dos estudos realizados com antioxidantes no tratamento da DA não sustentam esses benefícios (Birks e Flicker, 2003).

Estrógenos

A terapia de reposição estrogênica foi proposta como ação preventiva da DA, com base nos mecanismos neuroprotetores demonstrados in vitro e em modelos animais. Os estrógenos exercem efeitos cerebrais mediante a transdução de sinais a partir de diferentes receptores da superfície neuronal, ativando fatores de crescimento, promovendo a liberação de neurotransmissores e aumentando o fluxo sangüíneo cerebral. Ainda, estudos experimentais sugerem que 17-β-estradiol podem atenuar a neurotoxicidade promovida pelo β-amilóide em modelos celulares (Green et al., 1996). Estudos iniciais, em pequenos grupos de pacientes, sugeriram que a reposição hormonal breve pode exercer efeito benéfico sobre a cognição. Contudo, os resultados dos estudos maiores e randomizados em pacientes com DA derrubaram o entusiasmo inicial. Dois ensaios clínicos controlados não confirmaram a eficácia dos estrógenos no tratamento da DA (Henderson et al., 2000; Mulnard et al., 2000).

Para avaliar o potencial preventivo dos estrógenos sobre o risco de DA, um grande estudo prospectivo multicêntrico foi realizado nos EUA (Women’s Health Initiative Study). Em estudo prospectivo multicêntrico de sete anos de duração realizado nos Estados Unidos (Women’s Health Initiative Memory Study), o tratamento hormonal combinado (estrogênio e medroxiprogesterona) foi comparado com a reposição estrogênica isolada, respectivamente em 4.532 e 2.747 mulheres com idades entre 65 e 79 anos e que não apresentavam sinais de comprometimento cognitivo. Os resultados foram altamente negativos no que se refere à suposta proteção dos estrogênios contra a DA: a reposição estrogênica simples não diminuiu o risco de demência ou de transtorno cognitivo leve, e o tratamento combinado resultou em aumento risco de ambas as condições (Shumaker et al., 2003 e 2004).

Antiinflamatórios não-hormonais (AINH)

Fenômenos inflamatórios ocorrem secundariamente ao longo da maturação e nas adjacências das placas senis, como parte da cascata do β-amilóide. Ocorre acúmulo de células microgliais ao redor das placas, reações de fase aguda mediadas por citocinas locais e ativação da cascata de complemento. Além disso, estudos com camundongos transgênicos sugeriram que a indometacina e o ibuprofeno podem reduzir a formação de β-amilóide (Lim et al., 2001). Desse modo, é aceitável supor que os antiinflamatórios possam também exercer efeito neuroprotetor, modificando a patogênese e, assim, o risco de DA. Estudos epidemiológicos conduzidos no final década passada sugeriram que o uso prolongado de antiinflamatórios não-esteróides estaria associado a uma redução de na incidência de DA, porém não afetando o risco de demência vascular (in t’ Veld et al., 1998; 2001). Esse benefício seria restrito aos usuários crônicos desses medicamentos, tais como os portadores de doenças reumáticas e ortopédicas, pois, de outra forma, esse suposto efeito neuroprotetor seria suplantado pelos riscos da exposição contínua aos antiinflamatórios.

Essa indicação foi revista com o advento dos antiinflamatórios inibidores seletivos da ciclo-oxigenase 2 (COX-2), dado o menor risco de complicações gastrintestinais e renais. Contudo, ensaio clínico multicêntrico randomizado controlado com placebo demonstrou recentemente que rofecoxib ou naproxeno em baixas doses não protegeram os pacientes contra a progressão da demência em pacientes com DA leve a moderada (Aisen et al., 2003). Ainda, estudos de metanálise recentes concluíram que não há evidência da eficácia dos AINH na DA (Tabet e Feldmand, 2003). Portanto, até o presente, não se justifica o uso dos AINE no tratamento ou prevenção da DA.

Estatinas

Estudos derivados das ciências básicas demonstraram uma interdependência entre o metabolismo do colesterol, o genótipo da apolipoproteína E, e a via metabólica do β-amilóide, com implicações sobre a patogenia da DA (Evans et al., 2004). Alguns estudos clínicos sugeriram menor risco de DA em pessoas que utilizam estatinas com a finalidade de reduzir seus níveis séricos de colesterol. Apesar desses resultados preliminares lançarem questões pertinentes acerca do emprego de estatinas como medida preventiva para a DA, estudos epidemiológicos recentes, conduzidos com rigor metodológico, descartaram essa associação, justificando os achados positivos com base em artefatos das análises estatísticas anteriores (Li et al., 2004; Zandi et al., 2005).

Ginkgo-biloba

O extrato de Ginkgo biloba, EGb761, contém glicosídeos de ginkgoflavonas e terpenóides, cuja ação combinada promove o aumento do suprimento sangüíneo cerebral por vasodilatação e redução da viscosidade do sangue, além de reduzir a densidade de radicais livres de oxigênio nos tecidos nervosos (Luo, 2001). Modelos laboratoriais demonstraram que o EGb761 exerce ação preventiva sobre a neurotoxicidade pelo β-amilóide, além de inibir vias apoptóticas e proteger os tecidos nervosos contra lesão oxidativa (Luo et al., 2002; Zhou e Zhu, 2000; Sastre et al., 2000).

Os efeitos do EGb sobre a cognição normal foram avaliados em adultos jovens e idosos, com melhora objetiva na velocidade de processamento cognitivo, além de uma impressão subjetiva de melhora das habilidades gerais de memória (Rigney et al., 1999; Kennedy et al., 2000; Mix e Crews, 2002). Contudo, os estudos clínicos em paciente com DA mostraram achados inconstantes. Um estudo multicêntrico sugeriu que o tratamento com EGb761 por 52 semanas, na dose de 120 mg ao dia, proporcionou benefícios modestos, porém objetivamente detectáveis (Le Bars et al., 1997; 2002). Estudo de metanálise (Birks et al., 2002) mostrou, quanto à eficácia pela impressão clínica global, que existem benefícios em parâmetros cognitivos, de atividades da vida diária e humor, com superioridade em relação ao placebo. Entretanto, outros estudos apresentaram resultados inconsistentes, questionando a indicação da EGb no tratamento dos transtornos cognitivos (Birks et al., 2002). Encontra-se em andamento alguns estudos multicêntricos internacionais para avaliar o efeito do EGb761na prevenção de demência do tipo DA.

Outras drogas

Outras substâncias com suposta ação no sistema nervoso central, tais como melatonina, vasodilatadores, bloqueadores de canais de cálcio e nootrópicos, embora largamente prescritos na prática clínica, não têm sua eficácia demonstrada por métodos científicos. Devem, portanto, ser evitados, para evitar e polifarmácia e os gastos desnecessários com o tratamento.

Perspectivas futuras


O desenvolvimento de opções terapêuticas mais eficazes e seguras consiste em um dos objetivos mais avidamente perseguidos no cenário científico internacional. Drogas capazes de modificar a evolução natural da doença, ao lado da antecipação do diagnóstico, representarão o futuro do tratamento da DA e outras demências. Nesse contexto, a compreensão dos mecanismos que levam à morte neuronal na DA será a base para o desenvolvimento de novas drogas. Neste tópico, será discutido o potencial terapêutico de novas drogas como o fator de crescimento neuronal, dos inibidores da hiperfosforilação da tau e da terapia antiamilóide, incluindo a imunoterapia da DA, que após fase inicial promissora teve os estudos clínicos interrompidos em função de eventos adversos graves.

Fator de crescimento neuronal

Os neurônios dos núcleos colinérgicos do prosencéfalo basal são sensíveis à ação do fator de crescimento neuronal (NGF), sendo este último proposto como estratégia de tratamento para a DA. Em nível experimental, administração intraventricular de NGF em três pacientes com DA resultou em melhora nos padrões de fluxo cerebral sangüíneo e metabolismo de glicose, além de aumento dose-dependente da taxa de ocupação de receptores nicotínicos, mensurados pela tomografia por emissão de pósitrons (PET). Contudo, alguns efeitos colaterais importantes, tais como perda de peso e dores intensas, foram responsáveis pela interrupção do estudo e impediram a demonstração e validação de ganhos cognitivos bem definidos (Nordberg, 2003).

Terapêuticas antiamilóide

As terapêuticas antiamilóide têm como pressuposto teórico a hipótese da cascata do amilóide. Nesse modelo, o acúmulo de β-amilóide é um evento precoce e obrigatório na patogênese da DA. À deposição de formas tóxicas do peptídeo β-amilóide em tecidos cerebrais segue-se a sua agregação e polimerização sob a forma de placas (senis), levando à distrofia dos neurônios adjacentes, ao colapso do citoesqueleto, e à formação dos emaranhados neurofibrilares. Somam-se reações de estresse oxidativo e mecanismos inflamatórios, com ativação da micróglia e de fatores do complemento. Desse modo, ocorre a conversão das placas senis em placas neuríticas.

Os fármacos com propriedades antiamilóide, ainda em experimentação, podem ser agrupados em três categorias: (1) inibidores da fibrilogênese, (2) inibidores da formação, e (3) promotores da depuração do β-amilóide (para uma revisão sobre o assunto: De Felice e Ferreira, 2002). Entre os inibidores da fibrilogênese do β-amilóide, podem ser citados o quelante de metais clioquinol e o NC-531. Essas substâncias têm em comum a propriedade de reduzir a transformação de formas solúveis do β-amilóide em polímeros β-pregueados insolúveis

O NC-531 é uma droga patenteada pela indústria norte-americana Neurochem, Inc., sob a marca Alzhemed®. Tem como mecanismo de ação a inibição da fibrilogênese e a remoção das formas solúveis do β-amilóide, prevenindo assim a sua deposição em tecidos cerebrais e os eventos subseqüentes da cascata do amilóide. Corresponde a uma molécula orgânica de baixo peso molecular que impede a interação entre as glicosaminoglicanas e o peptídeo β-amilóide, supostamente necessária para que os polímeros de β-amilóide adquiram a conformação β-pregueada (Huang et al., 2000). Os resultados de um primeiro estudo duplocego com o Alzhemed® indicaram que a droga é bem tolerada em todas as doses empregadas e sua administração por três proporcionou, em um padrão dosedependente, a redução dos títulos de β-amilóide no líquido cefalorraquideano (Geerts, 2004). Em estudos clínicos de fase III, que deverão estar concluídos em 2007 ou 2008, pacientes com DA tratados com Alzhemed® ou placebo serão seguidos por 18 meses, sendo determinados também os parâmetros neuropsicológicos e de neuroimagem.

O clioquinol (iodocloro-hidroxiquina) é um quelante de cobre, ferro e zinco e representa uma abordagem com potencial terapêutico na DA (Finefrock et al., 2003). Existem evidências de que as interações entre o peptídeo β-amilóide e o cobre, o ferro e o zinco estão associados à formação e maturação de placas senis, na fisiopatologia da DA. No segmento extracelular da molécula da APP, existem sítios de ligação
para heparina, colágeno e zinco, além de domínios de inibição de proteases, sendo dois do tipo Kunitz (KPI) e um inibidor da gelatinase. Alterações da homeostase do cobre, ferro e zinco foram identificadas na DA, sendo que o manuseio inadequado desses metais facilita a deposição e agregação de partículas β-amilóide e a neurotoxicidade decorrente deste processo. Portanto, agentes quelantes de metais, como o clioquinol, oferecem potencial terapêutico, como modificador da patogenia da DA.

Em camundongos transgênicos tratados com clioquinol, foi observada redução no acúmulo de β-amilóide em tecidos cerebrais (Nordberg, 2003). Estudo clínico de fase II demonstrou, em 36 indivíduos com DA moderada a grave, que o tratamento com clioquinol, além de bem tolerado, proporcionou redução dos níveis plasmáticos de Aβ-42 e elevação dos níveis de zinco, estando esses parâmetros associados a uma menor taxa de deterioração cognitiva do que aquela observada nos pacientes do grupo placebo (Ritchie et al., 2003).

Os inibidores das secretases bloqueiam a ação de enzimas proteolíticas envolvidas na clivagem amiloidogênica da proteína precursora do amilóide (APP), reduzindo assim a formação do β-amilóide. As duas principais enzimas-alvo, nessa estratégia, são a β-secretase (BACE) e a γ-secretase. Siemers et al. (2004) apresentaram, na XIX Conferência Internacional sobre Doença de Alzheimer e Desordens Relacionadas (Filadélfia, 2004), os resultados ainda não publicados de estudo de fase I, controlado por placebo, com 37 adultos saudáveis submetidos por 14 dias ao tratamento com o inibidor da γ-secretase LY450139A. Os voluntários não apresentaram eventos adversos importantes no período do estudo, e o tratamento resultou em redução dose-dependente dos níveis plasmáticos de β-amilóide. Dados sobre a eficácia e segurança no longo prazo, evidentemente, são necessários para a continuação desses estudos preliminares.

Substâncias que favorecem a remoção do β-amilóide dos tecidos cerebrais representam a terceira estratégia antiamilóide em estudo. Aqui se destaca a imunoterapia da DA, que será discutida a seguir.

Imunoterapia da DA

Desde que Schenk et al. (1999) descreveram, em modelos de camundongos transgênicos, o clareamento das placas de β-amilóide em tecido cerebral mediado por anticorpos, o interesse em estratégias imunoterapêuticas intensificou-se. Os camundongos PDAPP, os quais superexpressam o gene mutante humano APP, progressivamente desenvolvem diversas alterações histológicas, replicando experimentalmente o padrão neuropatológico da DA (Schenk et al., 1999). Neste estudo germinal, foram selecionados quatro lotes de camundongos transgênicos PDAPP. O primeiro lote recebeu um agente imunogênico derivado da proteínaβ-amilóide humana (Aβ-42) sintética, o segundo foi imunizado com peptídeos derivados da seqüência primária do componente amilóide-P sérico (SAP), e o terceiro e quarto lotes foram considerados controles, recebendo solução tampão ou nenhuma substância, respectivamente. Os camundongos receberam 11 aplicações em um intervalo de 11 meses. Na primeira parte do estudo, os camundongos transgênicos PDAPP receberam as aplicações antes do início do desenvolvimento das alterações neuropatológicas tipo DA (idade de seis meses) e, na segunda parte, em idade mais avançada (11 meses), quando a deposição de β-amilóide e diversas das alterações neuropatológicas subseqüentes já estavam estabelecidas. Os camundongos imunizados com Aβ-42 tiveram os títulos de anticorpos mais elevados, comparados com o grupo SAP e os controles. O grupo SAP, apesar de exibir títulos mais elevados que os controles (cujos títulos foram desprezíveis), não diferia estatisticamente destes. No décimo terceiro mês procedeu-se, através de avaliação imuno-histoquímica quantitativa, a mensuração dos depósitos de β-amilóide, a contagem de placas neuríticas
e de reações de astrocitose e microgliose. A imunização de animais jovens preveniu o desenvolvimento e a formação de placas β-amilóide, distrofia neurítica e astrogliose. Dos nove camundongos imunizados com Aβ-42, incluindo um com baixos títulos de anti-Aβ, sete não apresentaram depósitos detectáveis nas análises cerebrais. A imunização com Aβ-42, além de evitar a deposição de β-amilóide nos tecidos, também aumentou o clareamento do β-amilóide cerebral. Este fato, associado à ausência de alterações neuríticas e glióticas neste grupo, sugere que os camundongos imunizados com Aβ-42, neste modelo, não desenvolverão as lesões neurodegenerativas progressivas similares à DA. Já a imunização com peptídeos SAP não afetou a formação de depósitos de β-amilóide, sugerindo que a resposta imune contra os componentes da placa per se é insuficiente para prevenir ou eliminar a deposição de β-amilóide e outros eventos neuropatológicos associados.

O segundo experimento serviu para esclarecer se a imunização com Aβ-42 poderia mudar o panorama neuropatológico cerebral, caso tal estratégia fosse usada após a ocorrência de substancial deposição de placas β-amilóide. Relatou-se que o tratamento de animais mais velhos reduziu marcadamente a extensão e a progressão das alterações neuropatológicas similaresà DA. Avaliações de depósitos de β-amilóide, distrofia neurítica e gliose foram significativamente melhoradas com a imunização (Schenk et al., 1999). Este trabalho foi importante por ser o primeiro relato, clinicamente relevante, de redução da progressão de alterações neuropatológicas similares a DA em modelos de animais transgênicos, abrindo-se a possibilidade de que a imunoterapia com β-amilóide poderia ser eficaz na prevenção e no tratamento da DA.

Estudos posteriores, de Janus et al. (2000) e Morgan et al. (2000), descreveram que a imunização ativa com peptídeo β-amilóide, em camundongos transgênicos também melhorava o desempenho cognitivo, com reversão do comprometimento de memória e de aprendizado. Particularmente interessante foi a replicação destes achados em modelos diferentes de camundongos, usando-se testes comportamentais diversos (White e Hawke, 2003).

Estes e outros trabalhos impulsionaram a realização de estudo imunogenético em humanos. O primeiro estudo de fase I com voluntários portadores de DA atestou a boa tolerabilidade e o potencial imunogênico de múltiplas administrações parenterais do composto NA 1792, que corresponde a agregados de Aβ-42 com o adjuvante QS-21. A partir daí foram iniciados os estudos de fase IIA nos EUA e Europa, a fim de determinar a segurança, a tolerabilidade e a eficácia da imunoterapia com β-amilóide no tratamento da DA. Trezentos e setenta e dois pacientes portadores de DA leve ou moderada foram randomizados para receber múltiplas doses intramusculares do composto AN1792 ou placebo, em uma razão de 4:1, no início do estudo e após um, três, seis, nove e 12 meses. Contudo, após entusiasmo inicial, os estudos foram interrompidos, em 2002, em função da ocorrência de meningoencefalite em uma parcela significativa (6%) dos 298 voluntários tratados com a vacina, em comparação com nenhum caso dessa complicação inflamatória entre os 74 indivíduos do grupo controle (Check, 2002). As administrações foram interrompidas após a constatação do quarto caso de meningoencefalite, mas o seguimento (duplo-cego) dos pacientes foi mantido. Doze pacientes tratados com o composto AN1792 e que apresentaram meningoencefalite recuperaram-se após algumas semanas, enquanto seis desenvolveram seqüelas neurológicas nos seis a 12 meses subseqüentes, quatro dos quais com desfecho letal. Em três dos quatro pacientes autopsiados, foram observadas reduções substanciais dos depósitos de β-amilóide em tecidos cerebrais, permitindo admitir preliminarmente a eficácia da imunoterapia na reversão da patologia relacionada ao β-amilóide na DA (Orgozogo et al., 2003).

Alguns dos achados clínico-laboratoriais desse estudo foram apresentados na XIX Conferência Internacional sobre Doença de Alzheimer e Desordens Relacionadas (Filadélfia, 2004). Os resultados dos testes laboratoriais desse estudo revelaram que apenas 20% dos pacientes imunizados apresentaram resposta imunológica positiva (definida por títulos de anticorpos anti-β-amilóide acima de 1:2.200). Nesses indivíduos, observou-se redução das concentrações de proteína tau no LCR, porém sem diferenças em relação aos controles quanto aos títulos liquóricos de Aβ-42. Os parâmetros neuropsicológicos primários também não foram significativamente diferentes entre pacientes responsivos e controles (Gilman et al., 2004). Curiosamente, nos estudos com volumetria por ressonância magnética realizados após 12 meses do início do tratamento, observou-se atrofia hipocampal e alargamento ventricular significativamente maiores nos pacientes responsivos a imunoterapia com β-amilóide do que nos controles. Os autores argumentaram que a perda acelerada de volume cerebral poderia dever-se à remoção dos depósitos de β-amilóide, que ocupariam uma porção considerável do volume hipocampal, e que a dilatação ventricular mais intensa poderia ser decorrente de leve hidrocefalia, associada a mecanismos inflamatórios (Fox et al., 2004).

Recentemente foi publicada a primeira análise da neuropatologia cerebral humana após a imunização com β-amilóide (Nicoll et al., 2003). Tratava-se de uma paciente de 72 anos, que satisfazia critérios clínicos para provável DA, com resposta terapêutica não satisfatória à rivastigmina. Após receber diversas doses, oito semanas depois do início do tratamento, a paciente apresentou deterioração cognitiva e diversos outros sintomas, tais como sonolência, tontura, febre e marcha instável. Veio a falecer de embolia pulmonar 20 meses após a primeira e 12 meses após a última dose. Comparando-se os achados neuropatológicos cerebrais desta paciente com casos de DA não-imunizados, os seguintes achados foram relevantes: (1) havia pequena concentração de placas de β-amilóide em áreas extensas de neocórtex (incluindo lobos parietais, temporais, frontais e occipitais); (2) aquelas áreas corticais, isentas de depósitos de placas de β-amilóide, continham densidades de emaranhados neurofibrilares e angiopatia cerebral amilóide (eventos neuropatológicos da DA que não são especificamente associados com placas) semelhantes a pacientes com DA não-imunizados, mas ausência de placas associadas à distrofia neurítica e aglomerados de astrócitos; (3) em algumas regiões de depósitos de placas, a imunoreatividade aoβ-amilóide foi associada com a micróglia; (4) meningoencefalite T-linfocítica estava presente; (5) infiltração por macrófagos substância branca cerebral. Os três primeiros achados associam-se às mudanças após imunoterapia com β-amilóide em modelos de camundongos transgênicos e sugerem que a resposta imune gerada contra o peptídeo eliciou o clareamento de placas de β-amilóide nesta paciente. A meningoencefalite T-linfocítica é provavelmente correspondente ao efeito colateral, visto em alguns pacientes que receberam AN 1792 (Nicoll et al., 2003).

Os estudos clínicos em humanos foram suspensos indefinidamente após o desenvolvimento de tais complicações inflamatórias associadas com a imunização. Esse processo inflamatório tem sido descrito como uma meningoencefalite asséptica e, apesar da exata causa ainda não ter sido estabelecida, é provável que se deva mais a mecanismos celulares que humorais (estudos demonstraram que tanto pacientes afetados como não afetados tinham altos títulos de anticorpo anti-β-amilóide, além do próprio exame neuropatológico descrito acima, que evidenciou meningoencefalite com células T) (White e Hawke, 2003).

Dois estudos subseqüentes, separados, mostraram que a reatividade intrínseca e células T à antígenos próprios β-amilóide existe em muitos indivíduos e aumenta quanto maior a idade. Esses achados podem ter implicações para o desenho de novas vacinas (Cirrito e Holtzman, 2003).

Monsonego et al. (2003) encontraram que alguns indivíduos saudáveis idosos, assim como indivíduos com DA, contém níveis basais elevados de células T reativas à β-amilóide. Enquanto a tendência geral, ao envelhecer, é uma diminuição da resposta imune, demonstrou-se aumento seletivo da reatividade a células Aβ em indivíduos idosos, independente da presença de demência. Apesar da causa ser desconhecida, especula-se que alguns desses indivíduos idosos cognitivamente preservados já possam ter depósitos de β-amilóide cerebrais (já que tais alterações parecem iniciar-se muitos anos antes dos sintomas mais precoces da DA). Uma possibilidade interessante é que esta mudança nas células T é uma resposta à agregação de β-amilóide, mesmo na ausência de demência clínica (White e Hawke, 2003).

Talvez as futuras vacinações excluam esses indivíduos com reação T substancial à proteína β-amilóide e eles constituam um grupo de candidatos à imunização passiva, já que é fundamental a minimização da toxicidade não desejada. Os laboratórios farmacêuticos Élan/Wyeth, responsáveis pelo desenvolvimento da imunoterapia com a droga AN-1792, iniciaram recentemente estudo de fase I com base na imunização passiva, na qual se administra um anticorpo monoclonal anti-β-amilóide (AAB-001), suplantando talvez os efeitos (e riscos) decorrentes da ativação imunológica excessiva dos pacientes.
Fonte

Órgão Oficial do Departamento e Instituto de Psiquiatria
Faculdade de Medicina - Universidade de São Paulo